Artigos

O amor de Cuba salva, não escraviza

Colaboradores cubanos da saúde levaram para as terras bolivarianas, durante anos, todo seu amor e sua dedicação. Foto: Arquivo do Granma
Colaboradores cubanos da saúde levaram para as terras bolivarianas, durante anos, todo seu amor e sua dedicação. Foto: Arquivo do Granma

Data: 

07/06/2019

Fonte: 

Granma International

Autor: 

« E você de onde é?». Foi a saudação inevitável diante da presença daquela jovem pequena de corpo, mas sem dimensão possível para descrever o trabalho que fazia quando a conheci. Seu nome: Edenys Reyes Galán, tinha 27 anos e eu a encontrei às portas do consultório médico popular (CMP) Los Manacales, em Casacoima, um dos municípios do estado Delta Amacuro, o mais oriental da Venezuela.
 
Alegre e ativa, respondeu-me imediatamente aquela jovem doutora em Medicina Geral Integral: «Eu sou de Bayamo, a terra do Pai da Pátria Cubana». E basta pensar sobre a diferença entre a ativa cidade oriental cubana e aquele lugar isolado, cercado por montanhas, florestas densas, admirei seu sacrifício e a dedicação ao que fazia todos os dias.
 
Soube então que levava 22 meses em terras bolivarianas e um ano naquele CMP em uma comunidade de extrema pobreza, na qual vivia acompanhada por um jovem da Missão Barrio Adentro Esportivo; ambos tinham a nobre missão de atender aos habitantes daqueles lugares isolados nos quais a «casa de saúde» — como algumas pessoas a chamam — parece uma luz na escuridão.
 
Minutos depois, convidou-me para um café e nos mudamos para a pequena cozinha de sua casa, que consistia de dois quartos, o local que serve para cuidar de seus pacientes e a enfermaria, também convertida em uma espécie de farmácia de medicamentos. No quintal, belas árvores de frutas e muitas flores, muito bem cuidadas, como se fosse um jardim doméstico e tropical, ao estilo cubano.
 
FAZER PARTE DA FAMÍLIA
 
Edenys me conta que uma das tarefas mais complexas foi chegar àquele lugar e completar o diagnóstico de saúde, cami-nhando dias inteiros, visitando casa por casa, por estradas inóspitas e desconhecidas, onde não fazia ideia de que houvesse casas.
 
«Diariamente tratamos entre dez e 15 pacientes que vêm de lugares distantes, mas é a única opção que eles têm para receber um serviço, antes eles não tinham nenhum e as principais doenças ainda são parasitismo devido às condições da água que ingerem e os maus hábitos higiênicos», confirma.
 
«Agora já sabem, pelo menos, as medidas para tornar a água mais potável e se cuidar um pouco mais».
 
Os problemas respiratórios também são recorrentes, as doenças crônicas não transmissíveis, como a diabetes e a hipertensão, bem como a gravidez na adolescência, diz a doutora de Bayamo e insiste que o máximo de tempo possível tem que se dedicar a palestras educacionais, mesmo nas casas como em algumas reuniões organizadas com o apoio do Conselho Comunal, que nestes locais é mais complexo devido às distâncias e distribuição das casas.
 
«Vejo que as conversas causaram um grande impacto, especialmente em jovens e adolescentes. No começo tive que procurar iniciativas e aprender muito com seus costumes e maneiras de ser, conversar, conviver e tive que ter muito cuidadosa, ganhá-los, fazê-los sentir que faço parte de sua família e que quero apenas ajudá-los», ressalta.
 
Para a jovem colaboradora, uma das tarefas mais delicadas que ela realiza é a reabilitação e cuidado de pessoas acamadas ou incapazes de se mover para receber cuidados. Acompanhada sempre pelo professor da Missão Esportiva, viaja quilômetros várias vezes por semana para ir aonde é mais necessária e ajudar pessoas feridas ou incapacitadas a recuperar seus movimentos e até reincorporar-se socialmente.
 
E esclarece: «É, talvez, uma das ações mais difíceis e humanas que realizamos. Às vezes, à tarde, depois desses longos dias, é muita fadiga, mas nos sentimos bem pela maneira como eles apreciam. O sorriso de um deles é o suficiente para dormir em paz e acordar no outro dia com mais desejo; não há direito à fadiga sempre que alguém precisar de nós».
 
No consultório-casa de Edenys, há um lugar histórico com o rosto de heróis e mártires cubanos e latino-americanos. As imagens de Che Guevara, Fidel e Chávez se destacam entre si, além de um belo cartaz de sua cidade: Bayamo. Em sua cozinha ela prepara um delicioso baião-de-dois, um prato típico que não pode ser descartado, embora ela sinta falta daquele que sua mãe fazia para ela «o melhor do mundo».
 
Ela é a única filha, a «menina» de casa apesar de sua idade; também assim que alguns pacientes olhavam para ela, por causa de seu pequeno tamanho. Conta aos seus pais o muito que faz e vive nestas terras, especialmente como ela é tratada pelas pessoas mais humildes com quem compartilha e ajuda a melhorar sua qualidade de vida. «Bom — digo quase todo — diz ela, sorrindo timidamente. É melhor assim, para não os preocupar».
 
Às vezes passa várias semanas sem falar com eles por causa de dificuldades com cobertura de telefone no lugar onde está e para sair fazer uma compra tem que viajar distâncias longas até chegar aos estados mais próximos, já que é 320 quilômetros por estrada de Tucupita, capital do Delta Amacuro.
 
Lembra com muito carinho a policlínica de Bayamo, onde trabalhou antes de ir para a Venezuela. «Mas é uma ótima experiência compartilhar com outras pessoas de outra cultura e aprender, esforçar-se tanto todos os dias. Aqui há uma extrema tranquilidade, porque há pouca população perto do módulo e é uma forte oposição a Bayamo, minha cidade, que é tão ativa, à qual dedico tantos pensamentos, especialmente à noite, quando vou descansar. Mas é muito gratificante ajudar essas pessoas, dar-lhes um sopro de otimismo», reafirma.
 
UM SORRISO COMO ESSÊNCIA
 
Edenys me oferece água de coco, muito refrescante por causa das altas temperaturas daquela região e, enquanto a bebo, pergunto a ela alguma anedota que a marcou profundamente durante sua missão: «Uma senhora chegou às 23h00 com dores de parto, com a criança com a cabecinha do lado de fora e quase não deu tempo para nada, pariu uma bebê preciosa quase em pé na porta do meu consultório e fizemos tudo sozinhos, até o professor de Esportes me ajudou. Que bebê linda! Imagine, deram meu nome e já quase corre», diz entusiasmada.
 
Momentos depois, batem na sua porta. Um jovem pede assistência médica. Edenys leva-o para o seu escritório e depois de um breve interrogatório começa a medir a sua pressão arterial. Peço licença e me despeço, abraça-me como alguém próximo e agradeço-me pela breve visita: «É sempre bom ter pessoas próximas, da terra, conversar, sentir-se acompanhados, mesmo que por um tempo, esteja onde estivermos. Convido-a para Bayamo, lá terá sua casa no meu retorno e meus pais vão adorar. Eu vou lhes contar sobre você».
 
Por alguns meses eu pensei muito em Edenys, o que fazia lá, sua dedicação às pessoas daquele lugar isolado com a essência de um sorriso. «Vocês são os verdadeiros heróis», disseram os Cinco antiterroristas cubanos aos nossos colaboradores durante sua visita à Venezuela, em maio de 2015, e um deles, Gerardo Hernández, o ratificou ao visitar Caracas como parte da delegação cubana ao 18º Congresso Latino-Americano dos Estudantes.
 
Jovens como ela são os protagonistas das histórias de façanhas diárias de nosso povo ao redor do mundo. Reafirmei então que tudo é possível quando a vida é defendida, embora muitas vezes seja abraçado pela solidão das florestas e pelo silêncio das distâncias mais inimagináveis.